sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O placebo

O frio consome os andarilhos numa triste madrugada de domingo. Olhando calmamente pela pequena porcão visível de uma janela embaçada estava um casal. Há quem diga se tratar de um casal diferente, ambos haviam trazido cicatrizes profundas de uma vida nem sempre tão generosa, mas só até este momento. Momento único este em que duas pessoas olham o pequeno pedaço da janela onde veem pessoas seguindo o curso natural da desgraça de suas vidas. Um senhor volta do bar depois de quase cinco horas, lembra que já não resiste tanto a bebida como quando era mais jovem e lembra-se da sua obrigação de cuidar de sua mulher doente. Um homem jogado na rua passa frio enquanto tenta acender seu cachimbo e adiantar cada vez mais o fim de sua vida, já havia sido uma pessoa com inspirações, sonhos e desejos, já se perguntou porque insiste em jogar sua vida no lixo, mas também se perguntou se algo de melhor o esperava, afinal, infelizmente não vivemos de sonhos. Passa uma garota de programa acendendo um cigarro logo após mais um cliente da noite, mas cuidado, tem de se apressar, seu pai acordaria em pouco tempo para o trabalho, e durante o sono de seu genitor, a garota esperava ganhar dinheiro e sair de sua vida medíocre. Mal sabe ela que a vida é feita de mediocridade e o dinheiro servia apenas de placebo para sua dor, a dor de ter de entregar seu corpo para conseguir mais que o básico da sobrevivência humana, a dor de lembrar dia após dia a imagem de sua mãe baleada em frente a sua casa por dever drogas. E o casal observava tudo atentamente, naquele momento as trajetórias que passavam a sua frente pouco importavam, todo o sofrimento alheio poderiam ser seus, mas simplesmente não o são, então se deitam, se amam, vivem a hipocrisia da vida e experimentam o seu maior placebo, o amor...

Nenhum comentário:

Postar um comentário